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Assinatura de chef

Fernando Torres

Doizum Comunicações

Se é verdade, como dizia Guimarães Rosa, que “Minas são muitas”, a gastronomia mineira contemporânea é a essência da diversidade. Nas últimas décadas, diversos chefs têm despontado com propostas que mesclam tradição e modernidade e exploram a cozinha de raiz, com versões inventivas do paladar nacional, mas sempre respeitando a genuinidade.

Chef Fred Trindade. Foto: Acervo pessoal

Na alta gastronomia contemporânea praticada, a essência mineira tem pitadas de técnicas francesas e influências de outros países. “A cozinha de Minas é unânime, une o país, tem conforto, carrega a identidade brasileira de acolhimento, de hospitalidade, de simplicidade. É uma cozinha que reúne as pessoas”, define o chef Fred Trindade, que comandou a cozinha dos restaurantes Trindade, em Belo Horizonte, e Tragaluz, em Tiradentes.


Para ele, ser moderno é valorizar o passado. Na prática, equivale a uma gastronomia conceitual, mas extremamente simples, com ingredientes afetivos, como arroz e feijão, mandioca e derivados, cachaça, café, peixes do rio e frutas do cerrado. “Nunca vamos evoluir se não estivermos atrelados à nossa cultura regional gastronômica", afirma Trindade, que, em 2013, ao lado de outros chefs brasileiros, representou o país no “Madrid Fusión”, uma das maiores feiras de gastronomia do mundo.


Outro chef que também participou deste evento histórico – e, inclusive, apresentou o pão de queijo mineiro à plateia internacional – foi Felipe Rameh, que acaba de se tornar embaixador e consultor do curso de Gastronomia da Faculdade Arnaldo, em Belo Horizonte. “Nossa geração busca novas leituras de receitas clássicas, com respeito à tradição. É você pegar a taioba, o quiabo, o porco, o milho e o frango e buscar interpretações inusitadas”, avalia ele.

Chef Felipe Rameh. Foto: Taioba Brava

Mineiro de Muriaé, na Zona da Mata, Rameh carrega no currículo passagem pelos restaurantes D.O.M e Dalva & Dito, de Alex Atala, em São Paulo, além de várias casas estreladas na Europa, como Mugaritz, na Espanha, e Le Chalet de la Forêt, na Bélgica. E ainda está na telinha, com a primeira temporada do programa “Coisas Daqui”, da “TV Globo”, disponível na plataforma “GloboPlay”. “Chamamos a atenção e a preocupação para ingredientes frescos e a indicação dos produtores locais, algo bem coloquial. Por exemplo: a goiabada da Pia Chaves, em São Bartolomeu; as receitas à base de jabuticaba da Dona Iara, em Sabará; e o pastel de angu da Dona Conceição, em Itabirito”, enumera.


Cozinha pop


Consagrado pelo público e pela crítica, Leo Paixão é, possivelmente, o chef mineiro mais pop – e empreendedor. Ex-apresentador do reality show culinário “Mestre do Sabor”, da “TV Globo”, ele formou-se em Medicina nos anos 2000, mas decidiu apostar tudo na gastronomia: mudou-se para Paris em 2009 e graduou-se na Escola Superior de Gastronomia Francesa (Ferrandi).

Chef Leo Paixão. Foto Léo Lara

De volta a Minas Gerais, chefiou a cozinha do francês Taste-Vin, em Belo Horizonte, até abrir seu próprio restaurante, o Glouton, em 2013, também na capital mineira. De base francesa, a casa trabalha atualmente apenas com menu-degustação, em que valoriza ingredientes e releituras de receitas de Minas. Estão lá, por exemplo: queijos Canastra e do Serro, frango com quiabo, costela de porco, tutu de feijão, jiló e rabada.


Em BH, entre outros negócios, Paixão também comanda o gastrobar Nicolau. O boteco “chique” envereda pela comida de “quintal”, onde são colhidas e plantadas ervas, folhas e temperos que fundamentam a base das receitas mineiras. Mas, sempre, claro, com o toque gastrô, como a sweet chili que recobre torresmos de barriga e coxinhas de galinha; ou o aioli que dá acento francês ao croquete de rabada. O conceito fusion se torna ainda mais elástico com o tempurá de quiabo na cerveja e no hambúrguer de porco com jalapeño.



Já no restaurante Ninita – batizado assim em homenagem à bisavó cozinheira –, Leo Paixão apresenta a gastronomia ítalo-mineira. Surpreendem, entre as criações, pratos principais como o ravioloni de ovo caipira e o risoni de caldo de mocotó e jabuticaba, servido com língua. Na ala de sobremesas, a releitura de tiramisù é feita com bom-bocado, e o mascarpone dá lugar ao queijo Canastra. Autenticidade sem perder a identidade.


Cidade gastronômica


Fruto do Ciclo do Ouro, a cidade colonial Tiradentes capta muito bem a singeleza e a essência da gastronomia mineira. A cidade tem seus próprios restaurantes e chefs estrelados. O Angatu, comandado pelo chef juiz-forano Rodolfo Mayer, é um dos mais requisitados. A casa tem cardápio enxuto, sempre renovado e com valorização de ingredientes locais – inclusive, vegetais, como taioba, quiabo, couve, milho, jiló, licuri e, claro, ora-pro-nóbis. “Esse é o meu ingrediente favorito. Faço um nhoque de baroa com crocante de ora-pro-nóbis que é de comer e rezar”, brinca o chef.

Chef Rodolfo Mayer. Foto: Thiago Morandi

Mayer também explora a comida mineira com técnicas de alta gastronomia, a exemplo do copa-lombo assado por 15 horas, ao molho melado, com abóboras e vinagrete de feijão-branco. Ou da galinhada caipira com baru, castanha típica do Cerrado; e do pão de queijo recheado com barriga de porco, picles de maçã verde e goiabada ácida.


No Tragaluz, restaurante gastrô dos mais decantados em Tiradentes, o chef Matheus Paratella serve a célebre “Pintada à Tragaluz”, galinha-d’angola confitada, acompanhada de arroz caldoso com paio e especiarias e mini brotos; e o “Porquinho Prensado”, barriga de porco crocante, cozida por horas em baixa temperatura e prensada na sequência, guarnecida com ceviche de banana, quiabo e farofa de ovos. Ainda mais famosa é a goiabada cascão frita na manteiga e prensada na castanha de caju e em catupiry, sobremesa que virou notícia até no jornal “The New York Times”.


Fundado há mais de duas décadas, o Tragaluz conquistou tamanha reputação que atraiu a atenção do Hotel Fasano de Belo Horizonte: desde 2019, o sisudo restaurante italiano Gero convida o chef do interior para contribuir com pratos especiais em seu cardápio fixo. “Nossa proposta sempre foi ir além de servir bem: encantar pelo esmero em cada detalhe, fazendo com que as pessoas vivenciem uma experiência diferente e prazerosa”, diz Pedro Navarro, proprietário da casa idealizada e comandada por muitos anos pela tia, Zenilca de Navarro.


Outra experiência gastronômica em Tiradentes é o leitão do chef Luiz Ney. Servido nos jardins da pousada Villa Paolluci, o almoço começa com bufê de petiscos mineiros. O porco, estrela da festa, é assado por sete horas e arrematado com um “pururucador” manual desenvolvido pelo próprio Ney, que transforma a pele em torresmo, sem comprometer a suculência da carne.


E assim, por meio do talento e da inventividade dos chefs mineiros, a cozinha do estado segue caminhando a passos largos - preservando a identidade da tradição e criando novos elementos que reforçam a criatividade das panelas de Minas.


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